20 anos de Super

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A Superinteressante oferece todo o seu acervo de textos gratuitamente, de 1987 a 2007! São mais de 12 mil páginas com as matérias de capa e algumas das seções que construíram a história da revista. Em breve, todos os especiais e o conteúdo integral das edições de 2008 também estarão disponíveis. Só mesmo uma revista tão Super poderia fazer isso!
"Crie seus filhos como príncipes, que quando se acharem reis, você será o BOBO DA CORTE"
Marcos Castilho
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Ser Mãe


Nós estamos sentadas almoçando quando minha filha casualmente menciona que
ela e seu marido estão pensando em 'começar uma família’.

Nós estamos fazendo uma pesquisa', ela diz, meio de brincadeira. 'Você
acha que eu deveria ter um bebê?'

Vai mudar a sua vida, ' eu digo, cuidadosamente mantendo meu tom neutro.
Eu sei,' ela diz, 'nada de dormir até tarde nos finais de semana, nada de
férias espontâneas.. .

Mas não foi nada disso que eu quis dizer.
Eu olho para a minha filha, tentando decidir o que dizer a ela.
Eu quero que ela saiba o que ela nunca vai aprender no curso de casais
grávidos.

Eu quero lhe dizer que as feridas físicas de dar à luz irão se curar, mas
que tornar-se mãe deixará uma ferida emocional tão exposta que ela estará
para sempre vulnerável.

Eu penso em alertá-la que ela nunca mais vai ler um jornal sem se
perguntar:
E se tivesse sido o MEU filho?'

Que cada acidente de avião, cada incêndio irá lhe assombrar.
Que quando ela vir fotos de crianças morrendo de fome, ela se perguntará
se algo poderia ser pior do que ver seu filho morrer.

Olho para suas unhas com a manicure impecável, seu terno estiloso e penso
que não importa o quão sofisticada ela seja, tornar-se mãe irá reduzí-la
ao nível primitivo da ursa que protege seu filhote.

Que um grito urgente de 'Mãe!' Fará com que ela derrube um suflê na sua
melhor louça sem hesitar nem por um instante.

Eu sinto que deveria avisá-la que não importa quantos anos ela investiu em
sua carreira, ela será arrancada dos trilhos profissionais pela
maternidade.

Ela pode conseguir uma escolinha, mas um belo dia ela entrará numa
importante reunião de negócios e pensará no cheiro do seu bebê.

Ela vai ter que usar cada milímetro de sua disciplina para evitar sair
correndo para casa, apenas para ter certeza de que o seu bebê está bem.

Eu quero que a minha filha saiba que decisões do dia a dia não mais serão
rotina.

Que a decisão de um menino de 5 anos de ir ao banheiro masculino ao invés
do feminino no McDonald's se tornará um enorme dilema.

Que ali mesmo, em meio às bandejas barulhentas e crianças gritando,
questões de independência e gênero serão pensadas contra a possibilidade
de que um molestador de crianças possa estar observando no banheiro.

Não importa o quão assertiva ela seja no escritório, ela se questionará
constantemente como mãe.

Olhando para minha atraente filha, eu quero assegurá-la de que o peso da
gravidez ela perderá eventualmente, mas que ela jamais se sentirá a mesma
sobre si mesma.

Que a vida dela, hoje tão importante, será de menor valor quando ela tiver
um filho.

Que ela a daria num segundo para salvar sua cria, mas que ela também
começará a desejar por mais anos de vida --não para realizar seus próprios
sonhos, mas para ver seus filhos realizarem os deles.

Eu quero que ela saiba que a cicatriz de uma cesárea ou estrias se
tornarão medalhas de honra.

O relacionamento de minha filha com seu marido irá mudar, mas não da forma
como ela pensa.

Eu queria que ela entendesse o quanto mais se pode amar um homem que tem
cuidado ao passar talco num bebê ou que nunca hesita em brincar com seu
filho.

Eu acho que ela deveria saber que ela se apaixonará por ele novamente por
razões que hoje ela acharia nada românticas.

Eu gostaria que minha filha pudesse perceber a conexão que ela sentirá com
as mulheres que através da história tentaram acabar com as guerras, o
preconceito e com os motoristas bêbados.

Eu espero que ela possa entender porque eu posso pensar racionalmente
sobre a maioria das coisas, mas que eu me torno temporariamente insana
quando eu discuto a ameaça da guerra nuclear para o futuro de meus filhos.

Eu quero descrever para minha filha a enorme emoção de ver seu filho
aprender a andar de bicicleta.

Eu quero mostrar a ela a gargalhada gostosa de um bebê que está tocando o
pelo macio de um cachorro ou gato pela primeira vez.

Eu quero que ela prove a alegria que é tão real que chega a doer.
O olhar de estranheza da minha filha me faz perceber que tenho lágrimas
nos olhos.

Você jamais se arrependerá', digo finalmente. Então estico minha mão sobre
a mesa, aperto a mão da minha filha e faço uma prece silenciosa por ela, e
por mim, e por todas as mulheres meramente mortais que encontraram em seu
caminho este que é o mais maravilhoso dos chamados.

Este presente abençoado de Deus... Que é ser Mãe. '

Essa é minha homenagem a esse ser que Deus teve todo o cuidado de criar.

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